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quarta-feira, 1 de maio de 2013

Diálogos de encarcerados


Naquele 1º de Maio, uma banda visita o presídio. É uma forma de recompensar os trabalhos forçados daqueles prisioneiros.

Sob o fedor de ambiente putrefato e carcomido, centenas de milhares, milhares de centenas, centenas de centenas ou inúmeros agentes tinham em mãos folhetos que silenciavam a festança que os cercava:

"O primeiro de maio é um dia extremamente importante na história dos povos modernos.

Em 1886, na cidade de Chicago, ocorreram as grandes manifestações para redução da jornada de trabalho que ficaram conhecidas como REVOLTA DE RAYMARKET, com a morte de diversos ativistas, que impulsionaram outros protestos pelo mundo e culminaram no início dos direitos trabalhistas.

Ainda hoje, mais do que nunca talvez, o homem se vê muitas vezes aprisionado ao trabalho. Sem tempo para a família, para o lazer, para o estudo. Principalmente nas metrópoles, onde o trânsito e o ritmo imposto para se pagar a 'sobrevivência' chega a ser absurdo em inúmeros casos.

É preciso refletir sobre os caminhos dessa nossa modernidade...aonde o progresso está nos levando? Estamos ficando mais livres...ou mais aprisionados com a evolução desse sistema?

Só neste ano - de todo o ORÇAMENTO PÚBLICO DO [PAÍS] (o montante que deve ser destinado à saúde, educação etc.) quase 50% foram diretamente para o pagamento dos JUROS DA DÍVIDA que temos com os banqueiros, nacionais e internacionais.

No fim das contas....quase todos trabalhamos para sustentar esse modelo de [prisionismo] baseado na DÍVIDA, nos JUROS e na exploração.

É preciso acordar e lutar!

Nem só de festa vive o HOMEM!"

Em meio à multidão, um deles ousa sussurrar:

 Gostei deste texto.

Um pouco além do seu ombro direito, uma voz anciã retruca, à medida que se aproxima do ouvido daquele primeiro a se manifestar:

 Justamente agora e neste dia, é importante dizer que os nossos representantes internos não trabalham mais para a redução da hora de trabalho, permanece a escravidão do deslocamento e imposição do local e da forma de execução do trabalho ou dos nossos estudos. E o que é pior, tal pensamento retrógrado espalha-se como uma epidemia virtuosa – como se isso existisse – e contamina a todos os setores, internos e externos, privados e públicos, sendo certo que pareceres, obras de arte, projetos e artigos são tratados, atualmente, como peças de montagem que devem ser produzidos em massa e com meta pré-determinada... Acham que um projetista, desenhista, programador etc. terá melhor capacidade de produção e inspiração.

Uma mão toca o ombro do primeiro manifestante. E a voz anciã conclui:

 Onde estão os militantes de hoje?

Um suspiro profundo e sincero demarca o tempo indefinido que precede a resposta, e então, o diálogo continua com os olhares rasteiros do primeiro manifestante:

 Estamos acuados, controlados, sob medida de falsas ideologias e talvez até de um certo comodismo, ou descrença sobre a possibilidade de sermos tão controlados. – Seus olhos inquietos parecem buscar no chão uma saída para situação tão incômoda. Antes de se ver ainda mais cercado a continuar a exclamar:

 Nos escondemos atrás de máscaras, veiculamos uma série de informações inúteis, enfim, continuamos a seguir os passos necessários para sermos considerados apenas “peões de um jogo”.

O desespero do primeiro manifestante é interrompido pelos dizeres, responsáveis pelo levantar de sua cabeça, emitidos pelo ancião, enquanto este aponta indiscriminadamente para a festança que os circunda, por dentro e por fora:

 E ainda batemos palmas para as medidas que vão nos manietar e nos conduzir para a nossa própria execução!

Os olhares de ambos escorriam entre si mesmos e para todo o presídio, enxergando agora animais sendo preparados e engordados para o abate.

Até que o primeiro manifestante, finalmente, contesta:

 Estamos sob rédeas tão curtas, que pensar em um 1º de maio como um dia reflexivo ou um dia de ócio ao invés de um dia de “interrupção do trabalho”, seria considerado utopia!

Seus olhos não buscam mais o chão, estão, agora, direcionados para si.

Inala-se, exala-se. Quando a parte verbal termina, a revolução individual tem início.



* O texto do panfleto retirado, levemente alterado (em formação, e foram trocadas algumas palavras que estão entre colchetes), de autoria da banda Famílias Gangters postado por sua página no Facebook em 1º de maio de 2013.
Os diálogos foram inspirados em diálogos ocorridos neste dia.
Todos os fatores produtivos são inspirados em "fatos reais". 



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