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sábado, 15 de setembro de 2012

Bobagens revolucionárias e outros escritos

"Doce como o licor de pequi, forte como a curraleira." Essa mistura poderosa sondava a cabeça do revolucionário sentado sob as sombras noturnas no ponto de ônibus. Suas intenções não eram claras nem mesmo nos seus pensamentos, por vezes, pensava no retorno para casa, por outras, sentia a necessidade de permanecer ali sentado onde as suas ideias realmente tinham luz.

Sempre tinha se encarado como um revolucionário, mas agora rebatia-se com a suas próprias indagações que usualmente fazia aos outros "Acredita que antigamente não era assim?". O verbo acreditar denotava o tom ditatorial do pensamento que fazia sobre si mesmo, dizia algo como: "sei que pode ser difícil, mas eu já fui igual a você, hoje sou melhor." 

- Que eu mesmo ou que os outros?

Naquela época do ano era comum o calor insuportável durante o dia, o que fazia aquela brisa suave e fresca da madrugada ter valor inestimável para que se pudesse pensar, "como um revolucionário", diria.

A metalinguagem daquela frase continuava a tilintar em sua cabeça: "antigamente", poderia ter colocado em seu currículo Revoluções em que participou: a primeira com os Emboabas em 1707; na França, em 1789; no México em 1910; e em Cuba de 1956 a 1959. Já não era tão ingênuo a ponto de dizer que participou da Revolução de 1964, lembrava-se bem da frase de Orwell "Não se estabelece uma ditadura com o fito de salvaguardar uma revolução; faz-se a revolução para estabelecer a ditadura."

Normalmente seus pensamentos não seguiam uma ordem cronológica e organizada como pretendia, voltava à doçura do licor de pequi, pensava no "antigamente", sentia a força da curraleira, e terminava por se perder na inutilidade. Alguns posicionamentos novos sairiam dali, certamente, não faria mais algo pela vontade de ser reconhecido, de ter seu nome anotado na história. Não sabia como definir, nem como prová-lo, mas a história não condiz sempre com a verdade. Como também não condizia "ser revolucionário".

Os caminhos que esperava percorrer eram tortuosos demais para conseguir definir os "certos" e os "errados". Qual revolução era realmente revolução? Qual causa era justa? Como começou? Quem é mais importante? A Burguesia ou o Povo? 

Era necessário uma reforma. Talvez até ainda seja. Talvez a revolução comece internamente, descobrindo que não há ponto de conforto, que a ditadura pode ser instalada do ser contra o próprio ser, nele mesmo ou contra o semelhante, e que a revolução calada sempre existiu e sempre existirá. Elas todas não estarão escritas em livros de história, não serão alvos de estudos filosóficos, não serão questionadas em debates políticos, ou sequer receberão menções nas conversas de outros "revolucionários". Elas simplesmente coordenarão o passo a passo, cada agir, cada pensar, cada falar... E sem méritos, para revolução ou revolucionário, ela se alastra, como lei natural, convidando a todos os inquietos a se revolucionarem. 

E quando a revolução alcançar o sucesso, a revolução ainda continua, porque, quando chegar a vez do revolucionário tomar o poder, outra revolução deve prosseguir. A unicidade da dualidade, do contraponto, da situação e revolução. Não há como mudar. 

- Gosto daquela frase do Orwell, mas acho que nunca a entendi bem: "O inimigo é a mentalidade do gramofone, concordemos ou não com o disco que está tocando agora".

Talvez seja o momento de revolucionar, ou reformar, a começar pela dignidade do revolucionário. 

- Tenho um interior digno de evolução? Como posso revolucionar?

"Doce como o licor de pequi, forte como a curraleira" - Acho que assim que começarei contando a minha história.


Napoleão Stálin de Sá Baeta Neves

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